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quinta-feira, 16 de dezembro de 2010


O professor, sua saúde e sua atividade profissional


As relações entre o trabalho docente, as reais condições sob as quais ele se desenvolve e o possível adoecimento físico e mental dos professores constituem um desafio, para Instituições de Ensino e Estado Brasileiro, e uma necessidade para toda a comunidade escolar entender o processo saúde-doença destes trabalhadores. Averiguando o contexto das políticas que visam à educação para todos, chegou-se à hipótese da defasagem das condições de trabalho em face das metas traçadas e efetivamente alcançadas, as quais acabam gerando sobrecarga nos docentes na realização de suas tarefas, pois devido maus salários precisam trabalhar em mais de um emprego (MEC/INEP, 2004).
A Organização Internacional do Trabalho definiu as condições de trabalho para os professores ao reconhecer o lugar central que estes ocupam na sociedade, uma vez que são os responsáveis pelo preparo do cidadão para a vida. Tais condições buscam basicamente atingir a meta de um ensino eficaz. As transformações sociais, as reformas educacionais e os modelos pedagógicos derivados das condições de trabalho dos professores provocaram mudanças na profissão docente, estimulando a formulação de políticas por parte do Estado (OIT, 1984). Até os anos de 1960, a maior parte dos professores gozava de uma relativa segurança material, de emprego estável e de certo prestígio social. Já a partir dos anos de 1970, a expansão das demandas da população por proteção social provocou o crescimento do funcionalismo e dos serviços públicos gratuitos, entre eles a educação.
Não se pode aqui, esquecer o papel do capitalismo e do liberalismo a partir do início do século XX, mas também do neoliberalismo de nossos dias, na defasagem salarial da atividade docente. Conforme, Antunes (2006), uma múltipla processualidade no mundo do trabalho pode ser percebida: a primeira é a desproletarzação do trabalho industrial fabril, o que significa diminuição da classe operária e migração destes trabalhadores para outras atividades como a docência, por exemplo, a segunda é a incorporação do contingente feminino no mundo do trabalho, aonde se vivencia uma subproletarização intensificada, presente na expansão do trabalho parcial, temporário, precário, subcontratado, “terceirizado”, que marca a sociedade dual no capitalismo avançado, o que joga o professor às margens do mundo do trabalho. Em contraste com profissões que se mantêm com status da nobreza medieval como a Magistratura, por exemplo.
O magistrado, segundo Maltez (1991/92), vem do latim magistratus, derivado de magister “chefe, superintendente” designava, em tempos passados, um funcionário público investido de autoridade. Desta forma um Presidente da República, por exemplo, receberia o epíteto de primeiro magistrado. A palavra latina magistratus tanto significa o cargo de governar (magistratura) como pessoa que governa (magistrado). Na terminologia romana "magistrado" compreende todos os detentores de cargos políticos de consulado para baixo. Inicialmente, os magistrados são os verdadeiros detentores do imperium, que anteriormente tinham os reis. O imperium é um poder absoluto, um poder de soberania; os cidadãos não podem opor-se ao imperium. O magistrado exercia sua autoridade nos limites de uma determinada atribuição, com poderes decorrentes de sua função, como os Juízes, os prefeitos, os governadores e presidentes. Na Antiguidade havia diversos tipos de magistrados, como os cônsules, os pretores, os censores, considerados magistrados maiores, e os edis e questores, os magistrados menores.
Na atualidade a palavra magistrado normalmente remete ao exercício do poder judiciário. No Brasil, os magistrados são tão somente os juízes, membros do Poder Judiciário, apesar de ambas as categorias, magistrados e membros do Ministério Público, gozarem das garantias constitucionais de vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos (subsídios). Uma herança das inúmeras injustiças dos tempos medievais europeus e colonial/imperial brasileiro, haja vista, os Magistrados não terem em sua maioria, feito Mestrado ou Doutorado, no máximo são Especialistas. Trabalham bem menos horas por dia, que um professor, tem mais recessos, benefícios e férias que o docente, que na maioria dos casos são mais qualificados e quando são doutores são de fato e de direito e não por tradição. Não se faz aqui nenhuma calunia ou difamação a tão nobre profissão ou profissionais, somente se compara como este (o Magistrado) estuda e trabalha menos e é tão valorizado, e aquele (o docente) estuda tanto e trabalha tanto, e é tão pouco valorizado.
Contudo, o papel do professor extrapolou a mediação do processo de conhecimento do aluno, o que era comumente esperado. Ampliou-se a missão do profissional para além da sala de aula, a fim de garantir uma articulação entre a escola e a comunidade. O professor, além de ensinar, deve participar da gestão e do planejamento escolares, o que significa uma dedicação mais ampla, a qual se estende às famílias e à comunidade. Embora o sucesso da educação dependa do perfil do professor, a administração escolar não fornece os meios pedagógicos necessários à realização das tarefas, cada vez mais complexas (SOUZA 2003). Os professores são compelidos a buscar, então, por seus próprios meios, formas de requalificação que se traduzem em aumento não reconhecido e não remunerado da jornada de trabalho. Por isso, adoece, pois a condição de estresse é de alto desgaste, nesse nível, o professor perde a possibilidade de criar e intervir no trabalho. Ele tem muitas tarefas para desempenhar e não consegue criar soluções para os problemas que aparecem (TEIXEIRA, 2001).
A escola, como instituição que desempenha papel social e, ao mesmo tempo, se constitui em local de trabalho, é caracterizada por uma complexidade de múltiplas relações. Para investigá-la, faz-se necessária a adoção de um enfoque teórico-metodológico que possibilite a análise de suas dimensões objetivas em profundidade e extensão, ao mesmo tempo em que permita a apreensão e a interpretação das percepções dos sujeitos que nela atuam, acerca do problema que se deseja conhecer. A abordagem qualitativa responde a essas condições, uma vez que se preocupa com o universo dos significados, das ações e das relações humanas, e reconhece os sujeitos envolvidos na investigação, como capazes de elaborar conhecimentos e produzir práticas para intervir nos problemas do trabalho docente e as possíveis doenças adquiridas pela atividade profissional. O docente desempenha papel fundamental, porém se concebe aqui o conhecimento como uma obra coletiva em que todos os envolvidos, Escola, Universidade e Estado, podem identificar criticamente seus problemas e suas necessidades, encontrar alternativas e propor estratégias adequadas de ação para que o trabalho docente não seja sinônimo de doenças (CHIZZOTTI, 1998).
Por fim, os professores questionam as mudanças que se vem operando nas escolas, o que se apresenta por meio de uma crise de confiança no sentido e na qualidade da educação e nas repercussões sobre o seu trabalho. A intensificação do trabalho torna-se cada vez maior, mas as condições de trabalho, a estrutura encontrada na escola e a valorização de seus salários alteram-se pouco, deixando os professores mais expostos a críticas e, ao mesmo tempo, responsabilizando-os individualmente pelos males que atingem a escola e a má atuação do discente em face aos exames nacionais de desempenho escolar e do estudante. Por isso, docentes de todos os níveis devem se unir para forçar Instituições de Ensino e Estado, na busca da valorização da profissão e do profissional, da melhora da estrutura do espaço em que trabalham e na formulação de plano de carreira que exija qualidade e quantidade, mas também toda a assistência médico-hospitalar que for necessária. O professor precisa deixar a “Idade Média” no sentido de direitos e valores, não é justo ser tratado como camponeses; classe que não tinha o direito de movimento, de ascensão, haja vista, a sociedade ser organizada por estamentos, que é caracterizada pela pouca mobilidade social, o que parece ser este o desejo das classes que dominam que o professor seja marginal.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


ANTUNES, RICARDO. Adeus ao trabalho?: Ensaios sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. 11. ed. São Paulo: Cotez; Campinas, SP: UNICAMP, 2006.
CHIZZOTTI, A. Pesquisas em ciências humanas e sociais. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1998.
MALTEZ, José Adelino, Princípios Gerais de Direito — Uma Perspectiva Politológica. Tomo I — O Ambiente do Direito, ed. AEISCSP, Lisboa, 1991/1992.
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA. O déficit de professores no país O déficit de professores no país. Disponível em: portaldoprofessor.inep.gov.br/ estatisticas.jsp
ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. A condição dos professores A condição dos professores: recomendação Internacional de 1966, um instrumento para a melhoria da condição dos professores. Genebra: OIT/ Unesco, 1984.
SOUZA, K. R. Trajetória do Sindicato Estadual dos Profissionais da Educação do Rio de Janeiro (SEPE-RJ) na luta pela saúde no trabalho. 2003. Disponível em, http://www.scielosp.org/pdf/csc/v8n4/a27v8n4.pdf. Acesso em 10/12/2010.
TEIXEIRA, L. H. G. Políticas públicas de educação e mudança nas escolas: um estudo da cultura escolar. In: OLIVEIRA, D. A.; DUARTE, M. R. T. (Orgs.) Política e trabalho na escola: administração dos sistemas de educação básica. 2.ed., Vozes, Rio de Janeiro, 2001.

Professor Nilton Carvalho é teólogo, historiador, especialista em educação pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás-(PUC), mestrando em Ciências da Religião pela Faculdade Teológica Moriah de Niterói-RJ. ndc30@hotmail.com;http://historiaeculturandc.blogspot.com/; http://twitter.com/#!/profnilton07